terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Um dia substantivo - Poesia - premiação SindiClube 2018



CELSO LOPES 
POESIA:  UM DIA SUBSTANTIVO (2o. Lugar)

PRÊMIO NACIONAL DE LITERATURA DOS CLUBES / 2018.
Parecer da Comissão Julgadora da Academia Paulista de Letras, resultado e dados gerais de participação do PRÊMIO NACIONAL DE LITERATURA DOS CLUBES / 2018. Logo comunicaremos a data e local de entrega do prêmio, que será em São Paulo.   
Atenciosamente,  Antonio Clementin    -  Sindi-Clube Cultural
cultural@sindiclubesp.com.br   (11) 97979.2501  


(resultado)
POESIA .
(.....)  Em segundo lugar, surge um autor que desfia um protocolo de intenções, e podemos dizer, das melhores intenções, em relação a si mesmo e à sociedade em geral. Meticulosamente esperançoso, prudentemente otimista, revela porém o desencanto com os ornamentos e prefere o concreto, o ideal, o reto e o justo. O autor representa o Esporte Clube Banespa. É Celso Antônio Lopes da Silva, com o poema “Um dia substantivo”.


Um dia substantivo
que me atravesse sem medo
os caminhos de um campo minado
e me silencie da iminente explosão.
Um dia que me cegue, no ato, a poeira do chão.
Um dia substantivo, sem alarde,
acenando gestos à eternidade:
antes que seja tarde!...

Um dia substantivo
que me arraste à beira do abismo,
ou me atire às profundezas abissais.
Um dia que ignore nas minhas palavras vãs,
a sanha, a súplica e o desespero latente...
Um dia substantivo, sem alarde,
como todas as horas mortas da tarde:
antes que seja tarde!...

Um dia substantivo
que me leve em silêncio puro
para o rufar esfuziante das ondas do mar.
Um dia que me afogue o corpo e a alma
entre o oceano e a linha do horizonte.
Um dia substantivo, sem alarde,
suplicando-me que a vida aguarde:
antes que seja tarde!...

Um dia substantivo
que me traga um grito torto, reto e líquido,
dissipado num uivo sem sinal de exclamação...
Um dia que me deixe mudo pelos becos e esquinas
entre o espanto e a cópia xerox.
Um dia substantivo, sem alarde,
queimando em mim o fogo que arde:
antes que seja tarde!...

Um dia substantivo
que me interrompa a claridade inútil
e me dispense do azul e da escuridão...
Um dia que me arraste à luz total, ao brilho
lúcido e transparente das galáxias.
Um dia substantivo, sem alarde,
sentindo o que dentro e fora em mim invade:
antes que seja tarde!...

Um dia substantivo
que me leve vertiginosamente ao fim,
sobre as escadas espiraladas no entorno de mim...
Um dia que me acene com o mergulho sem volta,
ou à queda de um precipício à minha volta.
Um dia substantivo, sem alarde,
um dia concreto e abstrato, antes que tarde,
antes que seja tarde!...


Texto:  Celso Lopes      elipse84@terra.com.br   11 98487 1193





PARECER E RESULTADO DO

PRÊMIO NACIONAL DE LITERATURA DOS CLUBES
– ANO 2018 –
Realização:
Sindicato dos Clubes do Estado de São Paulo
Academia Paulista de Letras (APL)

PRÊMIO NACIONAL DE LITERATURA DOS CLUBES / 2018

POESIA, CRÔNICA E CONTO
Parecer da Comissão Julgadora
Um bom texto literário é, podemos dizer, a expressão do que vai na alma por meio de palavras. Já nas primeiras linhas de uma obra, o crítico preparado observa o trato com a linguagem, o domínio das técnicas narrativas, a densidade do pensamento, a desenvoltura da comunicação. E foram muitos, digo sem exagerar, os textos de qualidade apresentados nesta edição do Prêmio Nacional de Literatura dos Clubes.

O processo de análise dos três jurados é constituído de três etapas. Inicialmente, cada qual lê, atentamente, cada peça inscrita – e do autor, só conhece o pseudônimo. Anota qualidades e eventuais incorreções, deslizes ou mesmo defeitos de linguagem e de construção, e faz uma seleção prévia, listando aqueles trabalhos que considera apresentar mais méritos literários, nos três gêneros. Numa segunda etapa, promove-se uma reunião do júri, que coteja suas escolhas com aquelas feitas pelos companheiros. 

Dado que a literatura e a produção literária têm os seus pressupostos, quase sempre ocorre uma razoável coincidência de opiniões. Mas a unanimidade jamais é alcançada, porque há um componente estético a considerar: o gosto. Então, passa-se à terceira etapa, que é a discussão a respeito de aspectos que poderão levar um trabalho a se sobressair em relação a outro, e consideram-se elementos como técnica, criatividade, inovação, modernidade, relevância do tema, profundidade e... beleza.
Devo dizer que neste ano tivemos especial dificuldade para a escolha dos vencedores, graças ao elevado número de boas participações. Uma dificuldade, de todo modo, prazerosa, visto que ler bons textos faz bem para o coração e para o espírito.
Uma vez oferecida esta breve explanação de ordem técnica, passo, em nome da comissão julgadora da qual tenho a honra de participar, a nomear os vencedores.
Começo pelos poemas, que praticamente sempre falam de amor. E vou buscar Machado de Assis para coroar, com uma frase sua, a essência da poesia: “Cada qual sabe amar a seu modo; o modo, pouco importa; o essencial é que saiba amar.”

P O E S I A
Selecionamos três menções honrosas.
Uma é do Rio Grande do Sul. Um exercício ternário, trissílabo, remete a um gotejar de acontecências que se espraiam em heptassílabos, caem para redondilhas menores e reassumem o ritmo ternário. Isso, na forma. No conteúdo, debate social, inquietação e inconformismo. O autor pertence ao Grêmio Náutico União, de Porto Alegre. É Álvaro Santi, com o poema “Manguezal”.

A segunda menção honrosa vai para concorrente que conhece profundamente a construção poética, trabalhando com rimas encadeadas, internas e coroadas. Parafraseia Manuel Bandeira, de quem difere pela métrica estudada e rica. Mas é poeta. E é mulher. Sabemos disso logo ao verificar que não descura das chamadas rimas graves – que são as rimas femininas. Ela pertence ao Círculo Militar de Campinas. É a autora de “Fernão de Magalhães”: Terezinha Bertazzi Costa.

A primeira menção honrosa vai também para uma mulher, também uma poeta, autora de também uma paráfrase. Propôs, com sua participação, o milagre da síntese, ao transformar a oração Ave Maria numa exortação feminista, mas, mais do que isso, antropológica e psicossocial. Essa mulher vem de Belo Horizonte, do Minas Tênis Clube. Seu poema é “Ave mulheres” e seu nome é Fernanda Ribeiro de Almeida.

Passemos aos três primeiros colocados nesta categoria.
Em terceiro lugar, comparece o autor de quadras em redondilhas maiores, bem ao costume do nosso cancioneiro caipira, nas suas louvações, cantigas e incelenças. Traz o resgate de memórias ao mesmo tempo em que registra os costumes e a sonoridade do nosso povo. São quadras suculentas, realmente de abrir o apetite. Esse mineiro representa o Clube Esperia, de São Paulo. É Magnus Castanheira, com a sua “Culinária caipira”.

Em segundo lugar, surge um autor que desfia um protocolo de intenções, e podemos dizer, das melhores intenções, em relação a si mesmo e à sociedade em geral. Meticulosamente esperançoso, prudentemente otimista, revela porém o desencanto com os ornamentos e prefere o concreto, o ideal, o reto e o justo. O autor representa o Esporte Clube Banespa. É Celso Antônio Lopes da Silva, com o poema “Um dia substantivo”.

O primeiro lugar é de um homem que, pela poesia, traça o caminho da humanidade, desde o antropoide ancestral, passando pelos textos bíblicos e chegando à moderna opressão da sociedade de consumo. Tem um traço do pensamento de Nietzsche, um pouco de Sartre, e a mesma indagação de Heidegger, da natureza e da essência do ser. Representando o Club Athletico Paulistano, de São Paulo, Luciano Martins Costa, com o poema “Pegadas”.
C R Ô N I C A
O júri igualmente selecionou três menções honrosas.
A terceira trata da opressão pela modernidade, que impõe comportamentos e persegue a homogeneização da sociedade. Decifra-me ou devoro-te, diz a esfinge tecnológica. E o homem se rende. Faz como todos e, paradoxalmente, nada faz pelo todo. Com essa
desesperança, e a bordo de uma ironia crítica. participou o representante do Círculo Militar de São Paulo, com a crônica “A Ansiedade no bolso”: Márcio Luiz de Campos Marques.
A segunda menção honrosa é quase uma apologia ao poema Motivo, de Cecília Meirelles: “eu canto porque o instante existe”. Tem a beleza de perscrutar a alma coletiva, de compartilhar sentimentos universais, dentro de uma situação de triste e solidária ternura. A autora representa o Círculo Militar de Campinas. A crônica se chama “Consolação, e a autora é Thais de Castro Rezende Rebello da Silva”.
E a primeira menção honrosa é uma celebração à linguagem. Termos precisos e escolhidos. Uma divagação sobre a vida e a pessoa, suas fragilidades, imanências e transformações. A autora representa o Clube de Campo de Piracicaba. A crônica “Metamorfose” é de Ivana Maria França de Negri.
Passemos aos três primeiros colocados nesta categoria.
Para o terceiro lugar, foi selecionada uma crônica da qual exsurge o amor pela leitura e pela literatura, amor, enfim, pela vida. Fala de uma experiência que revela um mergulho na comunhão. Como diz o repertório gregoriano, num dos mais belos cantos corais: Qui manducat meam carnem, et bibit meum sanguinem, in me manet et ego in eo. Quem come da minha carne e bebe do meu sangue, em mim permanece e eu nele. É do que fala a representante do Caiçara Clube de Jaú, com a crônica “A revisão”: Silvia Cachone.
O segundo lugar pretendeu uma crítica à sociedade de consumo, acostumada a padrões e obsessões. Questiona conceitos, oferece olhares humanizados e aplaude a autenticidade. Sua recomendação é enxergar além da alma exterior. O autor representa o Clube Indaiá, de Dourados, no Mato Grosso do Sul. Fala de “Uma beleza estereotipada” e seu nome é Mauro Francisco.
E o primeiro lugar vai para um autor que, no título de sua crônica, já remete a Ernest Hemingway. Uma reflexão dorida – e bela – sobre a morte, mas não estritamente sobre a perda, e sim as boas lembranças daquela vida que se foi. Com a bonita metáfora de que viver é como encher de grãos uma vasilha, com amigos, experiências e emoções. O autor representa o Clube Esportivo Helvetia. A crônica tem o título de “Por quem os sinos dobram”, e o autor é Carlos Augusto de Assis.
C O N T O
O júri selecionou três menções honrosas. É o número máximo de menções permitido pelo regulamento. Possível fosse, e o júri poderia ter concedido mais algumas, dada a qualidade dos trabalhos concorrentes.
A terceira menção honrosa ficou para um conto ensaístico. O autor escolheu um tema da atualidade: o suicídio. Relevante, porque no mundo inteiro perece mais gente por suicídio do que a soma de mortos pelas guerras e pela criminalidade. Só no Brasil, serão mais de 12 mil suicidas, em 2018. O autor discorre, em boa linguagem, numa quase carta-testamento, sobre morte assistida, eutanásia, e teima em dizer: minha vida e minha morte são minhas! Representando a Associação Brasileira A Hebraica de São Paulo, o conto é “Derradeiras palavras”, de Roland Fischmann.
Outra questão relevante é apresentada pelo conto que ocupa a posição de segunda menção honrosa: a saúde. Narrado a partir da ótica do cirurgião, o enredo retrata uma situação que pode ser tomada pelo leitor como imperícia ou descaso, mas atenuada pelas variáveis cotidianas a que o profissional médico está exposto. A autora representa o Club Athlético Paulistano. O conto é “Agora está tudo bem amarrado”, de Heloisa de Queiroz Telles Arrobas Martins.
Para a posição de primeira menção honrosa, uma narrativa gauchesca, dividida em três partes, como a trilogia O Tempo e o Vento, de Érico Veríssimo. Trata de um caso de assombração, ao feitio dos “Casos de Romualdo”, de J. Simões Lopes Neto. A linguagem respeita o ritmo e os modismos regionalistas, gênero que uma parte da crítica literária supõe superado, no que discordamos completamente. O conto é uma reverência à identidade nacional. Representando o Avenida Tênis Clube, de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, comparece o conto “O Lobisomem do angico”, de Antônio Augusto de Almeida Maioli.
Passemos aos três primeiros colocados.
Em terceiro lugar, um conto que começa com uma síntese clássica: em duas linhas, a autora consegue definir ambiente e clima. Bom início para uma trama que alterna espaços e tempos, tendo como pano de fundo uma das tragédias familiares do período da ditadura militar. A condução da narrativa é inovadora e criativa e a linguagem muito bem trabalhada. Representando o Club Athlético Paulistano, com o conto “Se fosse possível explicar”, a autora Maria Christina Tibiriçá Bahbouth.
Em segundo lugar, também uma mulher. Também um trabalho de tom regionalista, dando voz ao paulista interiorano, com seus usos e costumes domésticos e sociais. O enredo eleva a crítica da condição feminina e registra comportamentos de casa grande e senzala, infelizmente ainda correntes em nosso meio. Essa concorrente também representa o Club Athlético Paulistano. Com o conto “Doce de laranja amarga e um vidro de perfume”, seu nome é Maria Lúcia Perrone.
E, para o primeiro lugar nesta categoria, um conto epistolar. A autora – sim, é também uma mulher – escreve uma carta a William Shakespeare, comentando seu enlevo pela
linguagem e pela poética do bardo inglês. Explica como o conheceu, em literatura e espírito, e, de quebra, lhe traduz, do inglês, livre e belamente, dois sonetos. O conto é construído de maneira a mesclar memórias estudantis com análise breve de parte da obra Shakespeareana. Representando o Club Athlético Paulistano, este conto leva o título “Carta ao poeta”, e a autora é Giselda Penteado Di Guglielmo.
COMISSÃO JULGADORA:
Anna Maria Martins – escritora e membro da Academia Paulista de Letras
Mafra Carbonieri – escritor e membro da Academia Paulista de Letras
Joaquim Maria Botelho (relator) – escritor e ex-presidente da UBE - União Brasileira de Escritores
PRÊMIO NACIONAL DE LITERATURA DOS CLUBES / 2018
Obras vencedoras / poesia, crônica e conto
RESULTADO – AUTOR, OBRA E CLUBE:
P O E S I A
Primeiro lugar | Luciano Martins Costa | “Pegadas” | Club Athletico Paulistano (São Paulo – SP)
Segundo lugar | Celso Antônio Lopes da Silva | “Um dia substantivo” | Esporte Clube Banespa (São Paulo – SP)
Terceiro lugar | Magnos A. B. Castanheira | “Culinária caipira” | Clube Esperia (São Paulo – SP)
Menção honrosa:
– Fernanda Ribeiro de Almeida | “Ave mulheres” | Minas Tênis Clube (Belo Horizonte – MG)
– Terezinha Bertazzi Costa | “Fernão de Magalhães” | Círculo Militar de Campinas (Campinas – SP)
– Álvaro Santi | “Manguezal” | Grêmio Náutico União (Porto Alegre – RS)
C R Ô N I C A
Primeiro lugar | 1- Carlos Augusto de Assis | “Por quem os sinos dobram” | Clube Esportivo Helvetia (São Paulo – SP)
Segundo lugar | Mauro Francisco | “Uma beleza estereotipada” | Clube Indaiá (Dourados – MS)
Terceiro lugar | Silvia Cachone | “A revisão” | Caiçara Clube de Jaú (Jaú – SP)
Menções honrosas:
– Ivana Maria França de Negri | “Metamorfose” | Clube de Campo de Piracicaba (São Paulo – SP)
– Thais de Castro Rezende Rebello da Silva | “Consolação” | Círculo Militar de Campinas (Campinas – SP)
– Marcio Luiz de Campos Marques | “A ansiedade no bolso” | Círculo Militar de São Paulo (São Paulo – SP)
C O N T O
Primeiro lugar | Giselda Penteado Di Guglielmo | “Carta ao poeta” | Club Athlético Paulistano (São Paulo – SP) Segundo lugar | Maria Lucia Perrone | “Doce de laranja amarga e um vidro de perfume” | Club Athlético Paulistano (São Paulo – SP) Terceiro lugar | Maria Christina Tibiriçá Bahbouth | “Se fosse possível explicar” | Club Athlético Paulistano (São Paulo – SP)
Menções honrosas:
– Antônio Augusto de Almeida Maioli | “O Lobisomem do angico” | Avenida Tênis Clube (Santa Maria – RS) – Heloisa de Queiroz Telles Arrobas Martins | “Agora está tudo bem amarrado” | Club Athlético Paulistano (São Paulo – SP)
– Roland Fischmann | “Derradeiras palavras” | Associação Brasileira A Hebraica de São Paulo (SP)
COMISSÃO JULGADORA:
Anna Maria Martins | Academia Paulista de Letras
Mafra Carbonieri | Academia Paulista de Letras
Joaquim Maria Botelho | União Brasileira de Escritores
Literatura nos clubes brasileiros O PRÊMIO NACIONAL DE LITERATURA DOS CLUBES / 2018, 3ª edição, teve a participação de 170 inscrições de associados de clubes, cada autor participando com uma única obra de poesia, crônica ou conto. O Sindi-Clube e a FENACLUBES cumprem objetivo de promover a literatura nos clubes de todo o Brasil. Este concurso nasceu, em 2011, com o nome de PRÊMIO SINDI-CLUBE / APL DE LITERATURA, nas cinco primeiras edições. A parceria do Sindi-Clube com a Academia Paulista de Letras, não se resume ao prêmio literário e inclui, também, a promoção dos clubes de leitura, entre outras atividades. As seis primeiras edições do concurso literário tiveram as obras vencedoras editadas no livro Literatura nos Clubes Paulistas – Volumes 1 e 2.
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PRÊMIO NACIONAL DE LITERATURA DOS CLUBES/2018
– 46 clubes participantes de 26 cidades, 170 obras inscritas
PRÊMIO NACIONAL DE LITERATURA DOS CLUBES/2017
– 62 clubes participantes de 31 cidades, 256 obras inscritas
PRÊMIO NACIONAL DE LITERATURA DOS CLUBES/2016
– 45 clubes participantes de 22 cidades, 220 obras inscritas
PRÊMIO SINDI-CLUBE / APL DE LITERATURA/2015
– 29 clubes participantes de 13 cidades, 123 obras inscritas
PRÊMIO SINDI-CLUBE / APL DE LITERATURA/2014
– 24 clubes participantes de 10 cidades, 74 obras inscritas
PRÊMIO SINDI-CLUBE / APL DE LITERATURA/2013
– 25 clubes participantes de 7 cidades, 69 obras inscritas
PRÊMIO SINDI-CLUBE / APL DE LITERATURA/2012
– 19 clubes participantes de 6 cidades, 63 obras inscritas
PRÊMIO SINDI-CLUBE / APL DE LITERATURA/2011
– 22 clubes participantes de 11 cidades, 62 obras inscritas
O
s números da última edição do PRÊMIO NACIONAL DE LITERATURA DOS CLUBES / 2018, e das sete edições anteriores, sendo as cinco primeiras com o nome de PRÊMIO SINDI-CLUBE / APL DE LITERATURA, um total de sete edições, de 2011 a 2018, são os seguintes: – 275 clubes participantes de 128 cidades e 1.037obras inscritas. Houve uma participação crescente desde o início do prêmio, com uma obra por autor. Nesta edição houve participação igual em quantidade de inscritos entre os associados dos clubes paulistas e de clubes dos outros estados, mas o Estado de São Paulo continua, em pequena margem, com maior número de clubes. A participação de inscritos no prêmio cresceu em muitos clubes. Para que o associado participe, a divulgação é indispensável, mas para
alcançar o pleno resultado, o incentivo a prática da leitura e a realização de oficinas literárias são indispensáveis.

Números gerais de participação no PRÊMIO NACIONAL DE LITERATURA DOS CLUBES 2018 – 3ª edição: – 46 clubes participantes de 26 cidades, 60 POESIAS, 49 CRÔNICAS e 61 CONTOS – Total 170 obras. – Estado de São Paulo: Poesia: 20 | Crônica: 28 | Conto: 37 (subtotal de 85 obras), divididos entre 25 clubes de 12 cidades. – Outros Estados: Poesia: 39 | Crônica: 22 | Conto: 24 (subtotal de 85 obras), divididos entre 21 clubes de 14 cidades.
– Ranking de participação no
PRÊMIO NACIONAL DE LITERATURA DOS CLUBES / 2018:
POESIA – CRÔNICA – CONTO | clubes/inscritos:
Club Athletico Paulistano (São Paulo – SP) – 29 inscritos
Clube Recreativo Dom Pedro II (Conselheiro Lafaiete – MG) – 16 inscritos
Clube Indaiá (Dourados – MS) – 8 inscritos
Clube dos funcionários da CSN (Volta Redonda – RJ) – 7 inscritos
Clube Mackenzie (Belo Horizonte – MG) – 7 inscritos
Esporte Clube Pinheiros (São Paulo – SP) – 7 inscritos
Clube Curitibano (Curitiba – PR) – 6 inscritos









quinta-feira, 29 de novembro de 2018

A Sagrada Família - Conto de Celso Lopes

A SAGRADA FAMÍLIA 

Conto de Celso Lopes 
Menção Honrosa no 29 CONCURSO PAULO LEMINSKY - Ed. 2018 
TOLEDO/PR  -   Confira alguns dados do Concurso - Um dos mais famosos do país. 



29º CONCURSO DE CONTOS PAULO LEMINSKI

         

 A Secretaria de Educação, por meio da Biblioteca Pública Municipal - Centro Cultural "Oscar Silva", divulgou nesta terça-feira (13) o resultado da Vigésima nona edição do concurso literário mais famoso de Toledo, o Concurso de Contos Paulo Leminski.
 Ao todo, 625 pessoas inscreveram seus contos. Os participantes são de vários estados brasileiros e até de outros países. Nesta edição de 2018, houveram participação de Minas Gerais (45), Paraná (62),  Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul (82), São Paulo (163), e 13 contos do exterior: Áustria, Japão, França,   Portugal (5), Itália, Alemanha (2) e Suíça.
 Comissão avaliadora
A comissão foi composta pelos seguintes membros: Maria Beatriz Zanchet, Mestre em Educação; Isabel Cristina Gimenez, doutora em Estudos Literários; Clarice Lottermann, doutora em Literatura Infantil; Dulce Alves Nakamura, graduada em Comunicação Social, com Habilitação em Jornalismo e mestra em Educação; Marli Menegazzo Webler, professora e Especialista em Ciências da Educação; Nelzi Kzan Pancera, mestre em Linguística e L. Portuguesa; e Dari J. Klein, Especialista em Literatura Brasileira e Mestre Linguística e Língua Portuguesa.

Processo de avaliação
Os membros da Comissão Avaliadora efetuaram os trabalhos de leitura a partir do mês de agosto, tendo registrado sua avaliação numa planilha, recebida e entregue à Comissão Organizadora que, por sua vez redistribuiu igualmente aos outros membros da banca para atribuir uma nota numa planilha em branco. Ou seja, cada conto foi lido, nos últimos três meses, por pelo menos três membros da banca.   Na última sexta-feira (9) a Comissão de Leitura e Avaliação reuniu-se para reler, analisar, discutir, avaliar e decidir sobre o mérito literário das obras escolhidas e indicadas para a avaliação final.

Classificação
Por decisão da banca, a classificação final do Concurso foi a seguinte:
 1º lugar, de Nilson de Carvalho Lattari, o conto “Encontro na noite”, de Alto dos Passos, Juiz de Fora, (MG), cujo prêmio é de R$2.500,00;
2º lugar, de Isadora Bortoluzzi Massa, de Curitiba, (PR), o conto “Formas de poder”, cujo prêmio é de R$ 1.800,00;
3º lugar, de Alexandre Alliatti, de São Paulo, (SP), o conto “Gamarra”, que receberá um prêmio de R$ 1.500,00.
Melhor Conto Toledano
Além dessas premiações, o conto “Vida no sertão” de Maria Eunice Silva de Lacerda, Jardim Gisela, Toledo (PR), foi escolhido o Melhor Conto Toledano, cujo valor, segundo o regulamento, é de R$ 1.000,00.

Menções Honrosas

Ainda, por decisão da banca, foram indicados, para receberem Menções Honrosas, ordenados alfabeticamente por nome de autor, os seguintes contos:

Celso Antônio Lopes da Silva, com o conto A Sagrada Família; Frederico Dollo Linardi, com o conto As unhas de Elza (RS); Natália Nami; com o conto Que seja eterno, Barra do Piraí/RJ; Paula Giannini (Ana Paula Giannini Rydlewski), com o conto Nona; de Sumarezinho, São Paulo, (SP); Sandra Maria Godinho Gonçalves, com o conto “Vamos brincar?”, de Ponta Negra, Manaus (AM) ; Vitória Moraes de Oliveira Reis, (PR), com o conto Borderline, de Londrina, (PR); e o conto O entregador, de Maria Fernanda dos Santos, Rua Guaíra, Toledo (PR).
A cerimônia de premiação será no próximo dia 30 de novembro às 16h na Biblioteca Pública Municipal, localizada na Avenida Tiradentes, 1165. Os contos que foram premiados nesse evento e também aqueles que receberam menções honrosas, farão parte da 6ª Coletânea de Contos do Concurso Paulo Leminski. A próxima a ser lançada será em 2019.

Parte inferior do formulário

PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE TOLEDO – PR
Rua Raimundo Leonardi, 1586CEP 85900-110 - (45) 3055-8800


(leia o conto) 


 “A  SAGRADA FAMÍLIA”


Andrázio acomoda-se no sofazinho do quarto-e-sala.  Pouco a pouco,  incomoda-se  arisco  e com  pena de si próprio. Corre os olhos pelo interior do quarto-e-sala da Rio Branco, o matadouro. Sabe de cor e salteado que já são horas de aparecer a Zinhazinha -  Luciene ou Rosa Maria?. – Por instantes, a imagem da musa lhe foge do controle mental, então, pergunta  a si mesmo, como quem falasse pras  paredes ou  pra  janela semi-aberta, que escancara lá embaixo a vida que leva no aposento aqui  em cima; Andrázio repete alto, bem alto, altíssimo:   é a sina!... é a minha sina!... a minha própria sina – garante.  Urra, o leão:  são esses malditos rabos-de-saia  que já  no primeiro encontro me aparecem  inventando o pretexto.  Uiva, como uma fera: um Deus que me livre e me guarde de mim mesmo. Sua benção, meu Pai.   Um Deus que me proteja e me guie e que me tire das lábias afiadas dessas Zinhazinhas -   afirma temeroso, o pobrezinho.

- Vem, Andrázio, vem conhecer a minha mãezinha, vem!...

Andrázio escorrega o corpo  pelo sofazinho sem o  apoio dos braços.  Segue andarilho no entorno do quarto-e-sala, enjauladinho, enjauladinho. Não há folga, pressente o incômodo  entre as quatro paredes.  A cara de anjo, anjinho dos catecismos  refletida no espelho. Andrázio ajeita os cachos com o entrededo da mão no espelhinho cor de abóbora. Um presente da Mãe que vive jogado sobre a cômoda. O Pai que o esqueça – resmunga o herói. Defunto que descansa, o Velho. Proibir a viola, pensava o quê? O quê?... Então, eu não podia ser músico como tantos outros por aí? O Velho nunca teve a paciência com os violeiros. Uns vadios, uns vadios!... – dizia.   Andrázio tenta pela milionésima vez livrar-se dessa lembrança que o acompanha... mas, consegue? Deus me livre e guarde que não quero pensar nessas coisas! – desconversa o herói.  Não resiste, olha demoradamente pras mãos. A infância passou assim-assim,  cortando um riscado. O diabo na cruz, o que sofreu, olhando a surda-muda da viola dependurada na parede. As mãos, ainda hoje, sentem a dor da gaze. Dez anos enfaixadas, a sina que teve. Quem repara bem, ainda vê que traz os dedos assim juntinhos. Irmãos Siameses. Dez anos com os dedos grudados e enfaixados, que era pra não tomar gosto pela sonoridade do instrumento. A viola que ficasse lá no alto – dizia o Pai.  A Mãe tinha que cumprir, senão...

Enquanto se penteia, Andrázio pressente que as mãos não morreram assim tristinhas, antes, suicidaram!...- garante em soluços. Pranteia-se, por instantes demorados ouvindo o som da campainha.  Rosa Maria entra e  atira um  olhar que fulmina e entontece o galãzinho. Lá vou eu, Marianinho – diz pra si mesmo, o pobre de Marré, Marré, Marré...  Andrázio reitera, implicante:  Lá vou eu  guia de cego – balbucia molequinho, só pra se atentar.   Andrázio desassossega um tantinho a mais.  De novo um olhar sem jeito pro espelhinho cor de abóbora dependurado na parede – o presente da Mãe que nunca esquece.  Os olhos miram os cachos – cachinhos de Anjo, Anjinho dos catecismos. Confira o Senhor mesmo, insiste o desmiolado.   Enquanto confere os minutos que andam,  Andrázio  ouve  a  ladainha que martela em  seu ouvido.  Andrázio jura com os dedos em cruz  um ora pro nobis  endereçado a  essa  voz  mole-mole da danadinha. Voz macia e amolecida, a de Rosa Maria.   Malemolente até mandar parar,   feito o gingado de quem pede e suplica  uma água  de matar a sede. Água da fonte,  pura e cristalina.  Doce de gulodice, essa lábia-punhal que traz  dois gumes afiados e que me ferem de morte – reafirma, implicante, o coitadinho.  Andrázio ainda implora  um perdão de culpa e paixão sem escolher  o dia, a hora ou lugar.... Nesse momento... Ai... o grito explode. Reage aflito, o matuto. Ai... insiste em choramingos sem fim, o heroizinho das galerias.  Suplica um tantinho que dá pena a qualquer um:   tenham dó desse coitadinho de mim -  confessa o heróizinho  de Sampa, numa lenga-lenga manjada de lamúrias e lamúrias.  

Andrázio reitera tudo, tudo  com os pingos nos is: os meus olhinhos caindo bem nas coxas  de Rosa Maria.  A  boa vontade do vestidinho curto, solto, generoso, par-e-par com a bluzinha transparente;   o doce balanço, os botõezinhos de madrepérola, a minha coceirinha  nas mãos sobre o tecido folgando leve, esvoaçante; uma transparenciazinha pouco a pouco  liberada pelas redondilhas  dos botõezinhos reluzentes... doze, onze, dez, nove, oito, sete, seis, cinco, quatro....  Agora, agora livrar-se das últimas casas soltando os  botões que se desprendem em contagem progressiva e  ágil:   três, dois, um!...
Uma corrida no espaço, essa demora – o galãzinho sofre a dor e se derrama em prantos. Uns olhos atentos cronometrando e  conferindo a contagem em replay:   doze, onze, dez, nove, oito, sete, seis, cinco, quatro, três, dois, um... A seda fina, danadinha que só,  escorregando livre e macia  no colinho de Rosa Maria.  O herói pede socorro. Grita por dentro e por fora,  quase em  desespero:  essa mão boba que tenho – insiste -  segue escrevendo em linhas tortas – vez em quando com as costas das unhas -  displicentezinhas. Vou contornando  os  dedinhos na pele  morena de Rosa Maria.  As unhazinhas, aleatórias  como a insensatez de um lápis,   preenchendo com arte a brancura de um  risque-rabisque sobre a escrivaninha. Ai de mim. Ai de mim – o herói sente o peito arfante.  Surge no fundo, bem fundo,  ultrapassando a rouquidão,  uma dorzinha amorosa que perpassa  a quinta  vértebra da espinha dorsal.  Andrázio engole as sílabas medrosas, e sem se dar conta, transforma-se em lobo manso. Um cordeiro-de-deus somando as contas de três dígitos, insatisfeito com  o patrimônio. A dorzinha  no peito beirando 39, nenhum verso maior, nenhuma frase maior...  só os antibióticos!... O herói sente-se no fio da navalha.  Uma fera enjaulada junto  às esquinas  entre o espanto e a xérox.  Quem dera um demoniozinho  pra  fazer a mea-culpa, mea-culpa, minha   máxima culpa -  vaticina pra si mesmo. Esse, o maior dos perigos – prossegue temeroso -  um tremorzinho de doença,  os calafrios que lhe atacam o corpo. E atacam,  atacam,  atacam  – desconjura  o galãzinho, só meio a meio aturdido, sofrendo profundamente a dor que carrega pra sempre  nessa hora da vida. 

 - Mas, consigo dizer não, consigo? -  desarma-se,  o convencido.

É visível. O herói sofre ao descrever com todas as letras maiúsculas e minúsculas a história daquele  encontro. O pai de Rosa Maria – Andrázio faz questão de repetir  a frase  martelada pelo Velho: “ - se me foge essa filha, vou até o fim do mundo atrás do filha da puta” . O pai de Rosa Maria, continua o herói, o pai de Rosa Maria  trouxera toda a coleção de bichos empalhados. O Velho descrevia – prossegue o herói  – cientificamente, toda a fauna brasileira e estrangeira.  Apresentava a esse leigo,  um a um,  peixes, papagaios, araras  e gaviões,  gaivotas e  condores ...além de algumas espécies em extinção.
- Esta aqui é uma Águia!... ave de rapina da família dos Aquilíneos. Águia-real, inglesa, é diurna!... insistia com ar  professoral, o danado do Pai,   dando nota mínima a esse sofredor que sou eu. Andrázio descreve com todas as letras minúsculas e maiúsculas a história do  encontro. A  mãe de Rosa Maria – O Anjinho faz questão de  completar a frase da Mãe “ É um  moço bonito,  filha, o que ele faz? “  A mãe de Rosa Maria fritava os bolinhos. Receita de uma avó de Rosa Maria, dizia. Que eu  esperasse – prossegue o herói -  valeria a pena.  Um nadinha de nada  na demora. Só o tempo da fervura no tacho de cobre.  Uma delícia, quando quentinhos -  afirmou a futura sogra.

- Vem, Andrázio, vem conhecer a minha mãezinha, vem!

Esse, o pobrezinho que sou -  repete o herói. Uma  cara de anjo que não me livro. Repare você mesmo, insiste o desenxabido. Observe esses cachos, os cabelos anelados, cor de ouro,  os contornos enroladinhos ... Um anjinho,  um Anjinho dos catecismos, não pareço?  Diga,  tenho ou não tenho essa cara de Anjo?... Anjinho de catecismo,  sou  ou não sou?  Pois essa é  a minha sina cravada e  esculpida nesse rosto emoldurado.    O meu destino escrito em linha reta  com essas Zinhazinhas.   Ai de mim. Ai de mim com essa cara de anjo bom...anjinho dos catecismos!...   
Rosa Maria bem que desconfiava, refletiu o herói, lembrando-se da Rosinha-magricela, a menininha  da rua escura que esperava os  moleques  pra levantar a sainha. Ai de mim,  o sinal  que não entendi. O sinal da cruz. Um bobo-alegre o que sou diante de Rosa Maria. Dia desses, vaticina o herói,   voltar a estudar.  Aprender os códigos, os pingos e as letras.  Finalizar o “Ginasial”, terminar o “Colegial”, e depois,  aí, sim,  a Faculdade lá na frente... O heróizinho  lançou um olhar sobre a caderneta, um presente da Mãe,  nunca aberta, jogada ali mesmo sobre a cômoda –  O galãzinho arrisca uma outra mania que tem: um dia ser escritor, garante a si mesmo. Por vezes,  Andrázio tropeça  na própria história:  por certo, confessa a si mesmo, por certo, Rosa Maria carrega um  disfarce  de pai e mãe nesses gestos que ignoro -  lamentou-se, tristinho, tristinho. Segue analista: um jeito próprio que tem essa Zinhazinha com o movimento das mãos, do corpo e da mente:  espertos, libertos, desprovido de códigos, movidos à perspicácia e  uma inteligência  que não lhe falta nunca. Nunquinha...   Arre!... o herói reage em lamentos como quem  sofre a dor de um parto. Um sofredor contumaz.  O falatório que diz, agora, ganha ecos pelo quarto e sala:  conversa  sussurrada ao pé do ouvido nessa minha orelha de abano – justifica o eqüinozinho. Pecado em casa de padre, o aceno que não entendi.  Vou de mãozinha dada com Rosa Maria; vou arrastadinho que dá gosto. Uma Rosinha-magricela na rua escura me esperando pra levantar a sainha no bem-bom – sorri eufórico. Um desejo que não ocupa lugar nem hora – confessa o garanhãozinho duma figa.   Engano, insiste ele. Andrázio  resolveu desistir  do ato:  vou  corno – garante a si mesmo – vou  corno, vou mansinho e  infame,  e por dentro carrego o  carneirinho,  um cordeirinho-de-deus à flor da pele. Deus que  me livre e guarde.  Creio em Deus. Creio em Deus  Pai todo poderoso – benze-se duas vezes, o heroizinho profano;  benze-se  com os gestos articulados  da sua primeira-comunhão orientada, diariamente,  em sacrilégio pelo   padre Milton Cruz.  -  aflorou essa  lembrança, sem saber o porquê...

- Vem Andrázio, vem o conhecer o meu quartinho, vem!

Os botõezinhos de madrepérola, quem me dera.  Minha culpa, minha culpa, minha máxima culpa.  Rosa Maria seminua,  e eu?...  Malditos rabos-de-saia!...  Sempre ao meu ladinho  me atiçando a família.  A sagrada família,  a ferro e fogo. Goela abaixo, o que engulo nessas horas.  Esse ‘ar’ de coroinha, a nobreza que tenho. Sou  mesmo  um Marianinho de Igreja... - desconsidera-se, o troglodita. Diga, tenho ou não tenho essa cara de Anjo, Anjinho dos catecismos? Minha culpa, minha culpa, minha máxima culpa...  Todo rabo-de-saia quer um santo em família.. Eu, eu  quero a salvação. Um desapego   que me livre dessa agonia que trago.  Rosa Maria  seminua, nua, nuazinha  e  insistente, a taradinha...  Um reino de Deus que me livre do pecado à minha frente.. Pobrezinho de mim com essa cara de anjo. Anjinho bom. Um Cordeirinho  de Deus tirando os pecados do mundo. O quarto-e-sala da Rio Branco, a armadilha. O sofazinho de canto sem o apoio dos braços, a estratégia.  O herói estanca a mãozinha boba, mas não resiste ao  gesto. Rosa Maria  sem os sapatos, libertando  os gestos, o tempo e o estilo. Estonteante primavera de dois dígitos.  Idade 19,  16 e meio, o corpinho.  O sofazinho da sala, um tantinho inclinado,  a armadilha do plano -  confirma o herói.  Um corpinho que se deixa, malemolente, ali, estirado e seminu. - Ai quem me dera... os doze botõezinhos de madrepérola que meus dedinhos entreabrem – suspira o herói. A blusinha de seda  escorregando maliciosa, deixando ver a pele nua do corpo danadinho.  A arte emoldurada -  garante o safadinho a si mesmo. Os botõezinhos de madrepérola revelam-se almas gêmeas à espera de qualquer  mão boba que ande, avance, oriente, caminhe, percorra, ensine, alise, rodopie e faça cócegas... O herói tremelica  só de lembrar.  – Um Deus que me acuda – sorri o convencido ali no quarto-e-sala na Rio Branco. O minhonzinho de coxas roliças no puro sorriso.  Água na boca. Um estupendo  filé do Moraes, esse  manjar dos deuses – afirma o heroizinho.  Comer com os olhos. Rã à milaneza do Parreirinha, o que aprecio por demais, reitera Andrázio,  já saboreando os pratos.   Hoje, hoje com Rosa Maria, matar a sede. Livrar-se dos botõezinhos: doze, onze, dez, nove, oito, sete, seis, cinco... ensaia  o petulante.  Rosa Maria  sorri  tagarelando aos quatro ventos:

- Alicinha, minha amiga,  não vai me perdoar nunca, Andrázio...Eu, quase nua,   a  bem dizer,  nuazinha,  aqui contigo nesse sofázinho da sala,  Andrázio! ...

Um quarto e sala na Rio Branco, o matadouro. O sofazinho da sala com o assento largo, sem o apoio dos braços,  o meu golpe – late, late, late,  o ferino: 

-  Ai, quem me dera!... Andrázio esperneia como um bobinho de nascença. 

Sou esse anjo de mim mesmo, sou um  desmilingüido, um  pateta com o corpo em brasa dormida e desativado dos nervos;   esse  é o meu calafrio que sinto na  espinha. Os olhos do herói seguem  testemunhas: indicam uma severa reflexão, coisa pouco comum diante daquela sua estupidez de sempre no dia-a-dia.  Andrázio constata a cena final do encontro; agora, agora transformando-se  numa besta emburrada. Um heroizinho mudo.  O Anjinho   em frangalhos, fora  do tempo e lugar. Bandeira a meio-pau!...  o galãzinho sofre um dia-martelo que bate, bate e bate, sem nunca  atingir a poesia!...Quem dera o amor antigo, único, não esse, desconfiado, que trucida  em golpes de nocaute. Abatido, o heroizinho  sente  a força dos punhos de Rosa Maria  em  seu queixo  de vidro. Ela, de pé, as mãos levantadas à espera do troféu.   Ele, Andrázio, nocauteado, franzininho que dói. Um a menos na sua triste história de vida. Mil ao contrário. Mil de tabaréu.  O herói, ali,  debruçadinho sobre si  mesmo; os olhinhos parados,  pesarosos e suplicantes, teimando em ver os botõezinhos de madrepérola enviesados, sorrateiros e displicentes ao entreaberto lento e medroso das suas  mãozinhas pouco ágeis. Taradinho, o que sou!...- tenta se convencer, o pobrezinho. Mas segue solitário, um  homenzinho abatido no matagal da memória, engolindo seco os prantos de uma viagem sem volta. Leoa no cio, Rosa Maria. Os olhos certeiros, guardando no odre mil verbos à espreita, milhares,  à espera de uma  paixão fulminante e  sem pressa. O herói, descaidinho, um surdo-mudo sem o dom de ler os lábios. Carente de linguagem, o infeliz. Bandeira a meio-pau.  Rosa Maria nua, nuazinha...o herói,  esse, sem gestos,  sem estilo e sem jeito. Um tropeção na areia. O penúltimo dos espermatozóides. Um quase-homenzinho sentindo o veneno do BHC invadindo-lhe  as veias – o herói aponta  o braço – o esquerdo -   Um veneninho lento, colorido de um azul-de-metileno que vai se espalhando, infiltrando sem dó e  piedade  nesse ar que tem  e teima – raciocina insosso.   Uma outra linguagem, o que preciso -  garante pra si mesmo, o que acha que necessita.  Aos poucos,  complementa  o herói,  julgando-se  consistente -   sou mesmo umas sílabas que não se encaixam.  Sinto e pressinto. Uma outra sintaxe o que sou:  surda-muda!  - Andrázio  comemora essa conclusão  em silêncio profundo. Depois, sorri por instantes,  mas segue  enfezadinho, deitadinho em curva como um feto  com  a cabeça  reclinada,  apoiando-se  nas almofadinhas de chita, amparado e acarinhado pelos  doces afagos da donzela que  lhe alisa os cachinhos de Anjo. O Anjinho dos catecismos...




Texto:  CELSO LOPES