segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

QUEM ME LEVARÁ FLORES? Crônica de Celso Lopes


                              QUEM ME LEVARÁ FLORES...?      




Creio que os epitáfios famosos ou convincentes, registrados em lápides ou túmulos,  estão fadados à morte. Quer dizer – estão com os dias contados!...  Em tempos de WhatsApp,  é comum já virmos mensagens com  letras garrafais brancas sobre o fundo preto, informando LUTO ou CONDOLÊNCIAS, com as devidas explanações particulares da família e, eventualmente,  dos amigos.  A prosseguir neste caminho, deixaremos de nos fixar em mensagens que nos aprazia em visita aos túmulos de personagens que, se não éramos amigos, conhecíamos de nome. 
Seja um escritor como Álvares de Azevedo -  Foi poeta, sonhou e amou na vida.",  seja um  anônimo brincalhão com a própria sorte:  "Bati as botas!" (epitáfio de um sapateiro), “Acabou-se o que era doce” ( epitáfio de um Confeiteiro).  Não é difícil pesquisar referências a epitáfios destacados: Para Frank Sinatra, por exemplo, cantor, ator e produtor,  escreveu-se na lápide:  O melhor ainda está por vir”,  nome de uma famosa canção sua.  De um pistoleiro do Velho Oeste americano, Robert B. Allison, segue uma frase imponente:  Ele nunca matou um homem que não precisasse ser morto”.  E por aí vai; vejamos o caso de   Murphy A. Dreher Jr., de quem não se pode dizer que não era uma pessoa otimista: “Isto não é tão ruim, uma vez que você se acostuma”.  Do apresentador de TV, músico, cantor, ator e magnata da mídia americana,  Merv Griffin, surge uma frase que acerta o centro do alvo: “Eu não vou voltar depois desta mensagem”.
Ainda sobre epitáfios,  temos que observar também certas referências registradas em vida; e que, por ventura, simbolizam  o ‘momento final’ de maneira poética e, por vezes,  ainda de forma profunda como o próprio túmulo.  Veja-se, por exemplo, a música Epitáfio (banda de rock TITÃS),  que resgata atitudes ou frases  de  uma pessoa que já morreu e gostaria de mudar as coisas, se tivesse a possibilidade de viver novamente. Eis o texto básico: (...)  “Devia ter amado mais, ter chorado mais, ter visto o sol nascer” (...) Devia ter complicado menos, trabalhado menos, ter visto o sol se pôr (...) Devia ter me importado menos, com problemas pequenos, ter morrido de amor”.    
Nosso poeta romântico maior, Vinicius de Moraes, já em 1950,  não deixou por menos o seu epitáfio em vida. Pode-se dizer que a frase lapidar do poema “A hora íntima” segue além-túmulo revelando a própria alma do poeta ainda vivo: “Quem pagará o enterro e as flores se eu me morrer de amores?”...
 Mas há, ainda, outros versos questionadores,  precisos e preciosos:  “Quem, dentre os amigos, tão amigo, para estar no caixão comigo?”, ou ainda: “Quem virá despetalar pétalas no meu túmulo de poeta?”, e mesmo: “Quem, oculta em véus escuros, se crucificará nos muros?, e também:  Quem cantará canções de amigo no dia do meu funeral?
Ainda que não cheguem às lápides ou túmulos, ganham sobrevida constante os epitáfios dessa natureza na mão e nos versos dos poetas, pois escrevem ao vivo, em cores e em vida. A despeito do Whatsapp, creio que  nos resta, também, seguir os poetas, ainda que seja como mensagens póstumas, pois, com competência, sempre acertam o alvo.  É o que nos acena Ricardo Reis, heterônimo de Fernando Pessoa num provável epitáfio em seu túmulo,  cujas palavras  cantam a nossa própria vida:  “Para ser grande, sê inteiro: nada teu exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa. Põe quanto és no mínimo que fazes. Assim, em cada lago a lua toda brilha, porque alta vive”.
                                            

Crônica:  Celso Lopes   /  elipse84@terra.com.br   / celsolopesescritor.blogspot.com

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